Por Que É Tão Difícil Parar de Ler Dan Brown?

Ou, Qual Seria a Função Social de um Best-Seller?

É com muito pesar, e certa vergonha no andar, admito um esqueleto no armário: eu gosto muito dos livros escritos pelo Dan Brown. Sim, eu sei, ele escreve com uma fórmula literária pronta, mastigada e palatável para simplesmente vender livros e ganhar muito dinheiro, mas muito dinheiro, e com isso vender os direitos de seus livros para o cinema e assim ganhar mais dinheiro ainda, muito mais dinheiro ainda, num círculo quase perpétuo.

Isso sem falar da qualidade em si de suas histórias, que são, no mínimo, previsíveis e um tanto quanto absurdas, mesmo que plausíveis, apelando para um sensacionalismo que mistura num pastiche cultura pop e teorias da conspiração, mas ainda assim não consigo parar de ler qualquer livro que ele escreva, mesmo com vergonha de ler seus livros. Aliás, eu tenho essa sensação com a maioria dos autores de best-sellers: um dos meus autores preferidos é o Ken Follett, cuja literatura é tão rasa quanto um pires, porém suas histórias são muito bem narradas e construídas, o que cativa e desperta afetos no meu olhar como leitor.

No caso de Brown, acredito que uma das bases do sucesso dele é o fato do cherry picking que ele faz durante a sua narrativa ao pegar situações, evidências, instituições, teorias e fatos que são, na sua grande maioria, reais e verossímeis porém em seu conjunto totalmente impossíveis de acontecer, por simples questões de lógica e verossimilhança. Há um outro fator que é preciso ser levado é conta: Brown nunca é honesto com seus leitores, sempre escondendo detalhes dos casos por ele apresentados para nós, seus leitores, quebrando algumas regras clássicas do romance policial. É o velho truque do final “é tudo culpa do mordomo”, ou como eu gosto de chamar: Síndrome do Scooby-Doo.

A tchurma do Scooby-Doo

Se pegarmos a maioria dos livros “ruins” — não gosto de taxar um livro de ruim em tempos onde a palavra escrita está cada vez mais em segundo plano — tem uma qualidade: são incrivelmente fáceis de assimilar, são quase didáticos, e seu sentido mais rasteiro. O mesmo acontece em outras formas de arte, como por exemplo no cinema: se você pegarmos os filmes de maior bilheteria percebe-se que, apesar de algumas histórias fantásticas e até surpreendentes, eles são extremamente simples e assimiláveis. Outro exemplo: as telenovelas, que são o ápice da simplicidade em termos de teledramaturgia. Mais um exemplo: os espetáculos de comédia stand-up, que são simples em amplos aspectos, desde a montagem, cenografia, iluminação e roteiro. Ou seja, até mesmo o Dan Brown apresenta uma função social com a sua leitura: ser uma porta para outras leituras possíveis, despertando uma curiosidade e uma vontade literária.

O que esperar então? Apenas sentar, ler e aceitar.


Eu já fiz um vídeo pro nosso canal sobre o romance Inferno, do Dan Brown, você pode assistir ele aqui embaixo


Na foto capa da revista Time de 12 de Setembro de 1983 ilustrando a interceptação.

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