Sultão do Egito e da Síria
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As Cruzadas são consideradas um dos principais episódios para entendermos o período medieval em sua totalidade, ou seja, em seus aspectos religiosos, mentais, sociais, políticos e econômicos. Os cruzados carregavam em si o espírito medieval da mesma forma que Napoleão seria o Zeitgeist encarnado segundo Hegel. O contato entre os povos árabe-muçulmanos, naquilo que convencionamos chamar de islão, com os povos europeus cristãos, predominantemente católicos romanos, no que convencionamos chamar de cristandade, proporcionou uma série de personagens e eventos fascinantes, tanto no islão quanto na cristandade. E uma dessas personagens memoráveis é, sem dúvida, Salah ad-Din ou como ficou conhecido na cristandade, Saladino.

Nascido em 1137 na cidade iraquiana de Tikrit, a mesma onde Saddam Hussein nascera, e essa informação é importante, guarde-a, An-Nasir Salah ad-Din Yusuf ibn Ayyub era de origem curda, ou seja, distante da nobreza árabe-muçulmana que controlava o islão à época – aqui cabe explicar que o islão era dividido em dois grandes califados, o fatímida xiita do Cairo, e o abássida sunita de Bagdá, Saladino irá transitar pelos dois e será admirado apenas por um.
Ayyûb, pai de Salah ad-Din, era governador de Tikrit, cargo que ocupava em nome dos turcos seljúcidas, a terceira força política e militar dentro do islão, o que mostra a ainda mais a distância da família com os dois principais centros de poder dos povos árabes-muçulmanos da época. Logo após o nascimento de Salah ad-Din seu pai e o tio Shîrkûh, general das forças seljúcidas, entram para o serviço de Imad al-Din Zengi, atabegue que reina soberano em Aleppo e Mossul. Shîrkûh é o responsável pela educação tanto militar quanto dentro dos preceitos do islamismo xiita e é ele quem apresenta Salah ad-Din para o sultão Nûr al-Dîn, filho de Zengi, em Aleppo.
Cabe notar que durante os séculos 11 e 12 havia uma forte rivalidade entre os califas abássidas e os sultões seljúcidas, além de que o Egito fatímida também é chacoalhado por conflitos internos, ou seja, o islão estava em crise política e em disputa hegemônica. A unificação política do islão ocorre justamente com a presença dos cruzados, chamados de francos pelos árabes, na Palestina, principalmente após a formação e consolidação dos reinos latinos, especialmente Jerusalém, cidade sagrada tanto para muçulmanos quanto cristãos. E Saladino vai desempenhar papel fundamental nesse processo.
Em 1164 Salah ad-Din começa sua carreira militar ao lutar em diversas guerras ao lado de seu tio e em 1169 o califa fatímida Al-Adid o nomeia vizir, espécie de governador local, em 1171 o califado fatímida entra em colapso e Nûr al-Dîn toma o controle dos territórios antes pertencentes ao califa. Em 1174 o sultão morre e Shîrkûh assume o poder e o repassa para seu sobrinho que se torna o sultão do Cairo inaugurando assim a dinastia dos aiúbidas, colocando fim em duzentos anos de reinado fatímida.

Começava assim a unificação do islão sob um único líder, a união entre os fatímidas xiitas, que se enxergam como conquistados e não anexados, com os turcos seljúcidas e os abássidas sunitas, que ocupavam as porções mais ao norte do Oriente Médio, no que é hoje a Síria e, principalmente, o Iraque.
Salah ad-Din começa uma rápida expansão militar, conquistando territórios que vão da Cirenaica até a alta Mesopotâmia, e do Iêmen até a Síria, onde se coroa sultão e estabelece o seu título maior: sultão do Egito e da Síria. Após conquistar praticamente todos os territórios islamizados do Oriente Médio, com exceção da Pérsia, Salah ad-Din parte em campanha contra os cruzados e obtém diversas vitórias. E é nessa campanha que ele obtém a vitória pela qual ele iria ficar reconhecido.

Em 1187, já senhor de um vasto império e consagrado líder religioso, Salah ad-Din retoma Jerusalém dos cruzados, depois do famoso cerco e da rendição de Balian de Ibelin, libertando a cidade para a glória dos árabes. É nesse episódio que ele ganha o respeito e a honra entre os cristãos e reforça sua posição entre os muçulmanos, por não fazer um derramamento de sangue desnecessário, e sim negociar uma rendição do reino latino de Jerusalém, e ao respeitar as relíquias cristãs, o sultão do Egito e da Síria passa a ser enxergado como um modelo de cavaleiro e de cortesia.
A retomada de Jerusalém é acompanhada da libertação de diversas cidades na Palestina e no Líbano, além de ataques no Chipre. Essas campanhas militares iriam culminar no embate entre Salah ad-Din e Ricardo Coração-de-Leão durante a Terceira Cruzada, que iria se encerrar na Batalha de Jaffa de 1192.

Saladino morreria pouco tempo depois do fim da Terceira Cruzada, no dia 4 de março de 1193, em decorrência de uma febre, em Damasco, que substituirá tanto Bagdá quanto o Cairo como centro político, militar e econômico do islão. Dizem os historiadores e cronistas que Salah ad-Din doou toda a sua fortuna acumulada para o seus súditos mais pobres e que sua riqueza quando morreu não passava de uma peça de ouro e quarenta de prata, valor que não pagaria nem os serviços funerários. Ele foi sepultado em um mausoléu no jardim da Mesquita dos Omíadas, que fazia parte de um amplo complexo que incluía uma escola, a Madrassah al-Aziziah. O kaiser Guilherme II, que era simpático aos islâmicos, doou uma sarcófago de mármore para o mausoléu, que é aberto à visitação em Damasco, posto lado a lado com original de madeira em observação às tradições muçulmanas.
A memória de Salah ad-Din ainda permanece, tanto para muçulmanos, menos os xiitas, quanto para os cristãos. Esses o enxergam como um modelo de cortesia e de tolerância, um líder militar feroz porém humano, já para os sunitas ele é visto como um líder unificador e libertador, sua imagem foi apropriada, por exemplo, por Saddam Hussein, Gamal Abdel Nasser e Hafez al-Assad, além da Águia de Saladino, Eiqab Salah ad-Din em árabe, ser um dos símbolos do pan-arabismo e de resistência árabe, primeiro contra os cruzados e hoje contra o sionismo.
Contato: medievalissimo@gmail.com
- Texto: Bruno Rosa
- Edição de Áudio: Bruno Rosa
- Capa: Bruno Rosa
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